É curioso o modo como Jesus comunicava a dinâmica do Reino de Deus às pessoas. Ele não fazia o uso de um discurso enigmático e distante da realidade existencial de seus ouvintes, antes, pedagogicamente, fazia jus a uma fala inclusiva, partindo daquilo que era comum aos seus interlocutores. Jesus fazia-se compreensível, pois partia do chão existencial das pessoas, levando-as a perceber, no ordinário do dia-a-dia, através das pequenas coisas, nos detalhes da vida, o extraordinário de Deus.
Há quem diga, e com verdade, que Jesus fora o “Poeta da Compaixão”, visto o modo simples, porém profundo e cativante, de falar do Reino de Deus às pessoas. Através das parábolas ou comparações, Jesus tinha por finalidade colocar as pessoas em sintonia com as experiências que lhes eram cotidianas, corriqueiras (no seu ser pescador, camponês), para assim levá-las a perceberem o extraordinário no ordinário da existência humana, ajudando-as a abrirem-se ao Reino de Deus, que é o amor sem limites do Pai – Abbá – aos desprezados e marginalizados, que toca o coração do ser humano e convida-o à conversão: despir-se do homem velho e revestir-se do Homem Novo (cf. Ef 4, 22-33).
Nesse contexto, salta aos olhos a passagem bíblica contida em Mt 5, 13-16, que é o Evangelho proposto pela liturgia do 5º Domingo do Tempo Comum. Após fazer o belíssimo discurso das Bem-aventuranças (Cf. 5, 1-12), Jesus compara a existência daqueles que se colocaram no caminho com a imagem de dois elementos úteis naquele contexto: “Sal” e “Luz”. Tal comparação é provocativa. O sal é tanto um tempero, que, usado na medida certa, dá sabor ao alimento, como também um bom conservante que preserva o alimento. Quando Jesus compara seus seguidores ao sal, diz que eles melhoram, dão um sabor diferenciado à existência humana. É o sabor do amor e do cuidado de Deus. Além disso, o sal nos ensina o caminho da comunhão na diversidade, pois sua finalidade é alcançada, sobremaneira, quando utilizada em meio aos outros alimentos. Do mesmo modo, os discípulos são chamados a fazer a diferença na comunidade de fé, no contexto em que estão inseridos. No dizer do Papa Francisco, o sal é o discípulo “que se esforça por ser uma presença humilde e construtiva, na fidelidade aos ensinamentos de Jesus que veio ao mundo não para ser servido, mas para servir” (Angelus, 9/02/2020).
De igual modo a luz. A luz dissipa a escuridão e traz à vista o que se encontrava encoberto. Jesus é a luz que dissipou as trevas, mas elas ainda permanecem no mundo e nas pessoas individualmente. Assim, vai dizer o Papa Francisco: “é tarefa do cristão dispersá-las, fazendo resplandecer a luz de Cristo e anunciando o seu Evangelho. Trata-se de uma irradiação que pode derivar até das nossas palavras, mas deve brotar principalmente das nossas boas obras. Um discípulo e uma comunidade cristã são luz no mundo quando orientam os outros para Deus, ajudando cada um a experimentar a sua bondade e misericórdia. O discípulo de Jesus é luz quando sabe viver a sua fé fora dos espaços restritos, quando contribui para eliminar preconceitos, para eliminar calúnias e para fazer entrar a luz da verdade nas situações corrompidas pela hipocrisia e pela mentira. Fazer luz. Mas não se trata da minha luz, é a luz de Jesus: nós somos instrumentos para que a luz de Jesus chegue a todos” (Angelus, 9/02/2020).
À vista disso, as imagens empregadas por Jesus, “Sal” e “Luz”, evidenciam a perspicácia e a sutileza do modo como Jesus via, em todas as nuances da existência, a possibilidade de nos comunicar a vontade do Pai, por consequência, levando os seus ouvintes a compreender e internalizar a mensagem enunciada, a ver Deus que se manifesta na história humana. Portanto, com o modo de Jesus anunciar o advento do Reino, compreendemos que a vida, em seus desdobramentos, faz um apelo à nossa sensibilidade, a fim de notarmos a “assinatura do Criador” em sua obra criada, bem como convidando-nos à uma relação de intimidade consigo e, por consequência, a sermos colaboradores na construção do Reino de Deus, cuja marca é o amor afeito à proximidade e à solidariedade.
Equipe Arquidiocese em Missão
Arquidiocese de Montes Claros