Na Solenidade dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo (29 de junho de 2022), o Papa Francisco ofereceu à Igreja a Carta Apostólica Desiderio Desideravi, sobre a formação litúrgica do Povo de Deus. Ao contrário do Motu Proprio Traditionis Custodes, sobre o uso da Liturgia Romana anterior à reforma, que foi direcionada apenas aos bispos, a Carta Apostólica Desiderio Desideravi, para além dos bispos, é destinada aos padres e diáconos, às pessoas consagradas e aos fiéis leigos. Como é próprio do Papa Francisco, que como pastor costuma falar com muita simplicidade ao coração de seu Povo, seu intento não é o de oferecer uma instrução ou um diretório, mas um texto de caráter bíblico, patrístico e litúrgico, para meditação, reflexão; para auxiliar na redescoberta da beleza da verdade da celebração litúrgica (cf. DD, n. 21).
Ao longo da carta apostólica, percebe-se nitidamente o desejo do Santo Padre em assegurar a comunhão eclesial em torno do Rito Romano e promover uma aplicação das conclusões emanadas do Concílio Vaticano II, especificamente a partir da Sacrosanctum Concilium, reacendendo o ardor e a beleza da liturgia. Entende ele que “Uma Celebração que não evangeliza não é autêntica, tampouco um anúncio que não leva ao encontro com o Ressuscitado na Celebração: ambos, portanto, se carentes do testemunho da caridade, são como ‘um bronze que soa ou um címbalo que retine’ (1Cor 13,1)” (DD, n. 37).
A educação a partir do simbólico é algo que o texto também evidencia para assegurar o estupor – a admiração – a partir da liturgia, que é lugar, por excelência, do encontro com Cristo. Para o Papa Francisco, torna-se importante permitirmos formar-nos pela liturgia, cada um conforme a própria vocação, de modo que o próprio coração possa melhor entender o que vive: “a formação litúrgica, em sua primeira acepção, não é algo que possa ser conquistado de uma vez por todas: uma vez que o dom do mistério celebrado supera a nossa capacidade de conhecimento, esse empenho certamente deverá acompanhar a formação permanente de cada um, com a humildade dos pequenos, atitude que abre ao estupor” (DD, n. 38). A Carta prossegue oferecendo uma oportunidade de reflexão muito rica aos ministros ordenados quanto à arte de presidir a Eucaristia, e, também, aos fiéis leigos quanto à formação da personalidade cristã do indivíduo e da comunidade (cf. DD, n. 53).
Permitir formar-se pela Liturgia, portanto, não significa seguir um conjunto de rubricas e normas – o que chamamos de “rubricismo”, nem tampouco celebrar a Eucaristia sem piedade ou gosto – de modo exasperado, numa chamada criatividade “selvagem”. Uma autêntica formação litúrgica é espaço para reconhecer a Liturgia como grande obra de adoração e louvor da Igreja. É perceber “a importância de uma arte da celebração que está ao serviço da verdade do Mistério pascal” (DD, n. 62). Talvez, um primeiro passo a ser dado seja justamente cada um permitir “se render ao seu amor, de querer se deixar ser atraído por Ele” (DD, n. 6).
As palavras do Papa Francisco são um esperançoso convite para superarmos as divisões e, num caminho sinodal, ouvirmos o que o Espírito diz à Igreja (cf. Ap 3,13), deixando-nos surpreender com e pela beleza da Liturgia. Permitamo-nos, pois, ser envolvidos por este desejo que o Senhor tem em cada Eucaristia de poder comer ardentemente a Páscoa conosco (cf. Lc 22,15).
Equipe Arquidiocese em Missão
Arquidiocese de Montes Claros