Todos os anos temos a graça e a missão de celebrarmos, juntos, a Semana Nacional da Vida (de 1º a 8 de outubro) e o Dia do Nascituro (dia 8 de outubro). Nós, que recebemos de Deus, gratuitamente, esse primeiro e maior Dom, somos chamados a reverenciar a Vida e a refletir sobre nossa postura diante de tão precioso tesouro e diante de sua fragilidade frente a tantos ataques que se apresentam contra ele, sendo o mais violento deles, a legalização do aborto, atualmente proposta na ADPF 442, apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro.
É muito cruel saber que no momento mais inocente e vulnerável de nossa vida, no lugar onde deveríamos ser mais acolhidos, protegidos e amados, é quando nos vemos tão violentamente ameaçados, agredidos, descartados. É inaceitável, não somente para nós cristãos, mas para todo ser humano, que o ventre materno, templo da vida, se converta em local de destruição, abandono, morte, desamor.
É claro que nossa responsabilidade com a Vida não se resume ao nascituro, mas à dignidade humana em todas as fases de seu desenvolvimento, em todas as suas fragilidades, em todas as suas necessidades. Mas se não formos capazes de, prontamente, nos apresentarmos na defesa daqueles que mais precisam do nosso cuidado, então nossa missão pela valorização e preservação de toda vida estará fadada ao fracasso. O Papa Francisco, ao falar da nossa missão com toda a criação, e do nosso compromisso com os pobres, na encíclica Laudato si, afirma que “quando não reconhecemos na nossa realidade, o valor de um pobre, de um embrião humano e de uma pessoa com deficiência, dificilmente escutaremos os ‘gritos’ da natureza, pois tudo está conectado” (LS, 117).
Cada vez mais a Ciência nos confirma aquilo que a Verdade de fé sempre afirmou e defendeu: cada um de nós é um ser humano inédito, único e irrepetível, e nenhum de nós tem maior valor, maior dignidade ou mais direitos sobre o outro, pois Deus não poupou seu próprio Filho, mas o entregou por TODOS nós (cf. Rm 5,10), igualmente, em um só sacrifício.
Em especial, nesse ano de 2023, a Igreja, inspirada na Revelação de que nós, pelo batismo, já não somos mais apenas criaturas de Deus, mas nos convertemos em seus filhos adotivos por Jesus Cristo (cf. Ef 1,5), traz para esse tempo o tema “Adoção: Amor com laços do coração”. Sabemos que muitas famílias vivem em situações de conflito e miséria, que muitas mulheres vivem a tragédia do abandono e que há muita violência presente em nossa sociedade, mas sabemos, também, que escolhendo sempre pela Vida, o Senhor Nosso Deus e Pai nos acompanha, nos sonda, nos ama e nos conduz à morada eterna em Seu perfeito amor. São José, pai adotivo de Nosso Senhor Jesus Cristo traz aos nossos lares e corações seu exemplo de amor, confiança, força, doação e compromisso, e sua intercessão poderosa nas lutas diárias dessa missão.
O Catecismo da Igreja Católica nos convida a “mostrarmos nossa generosidade adotando crianças desamparadas ou prestando relevantes serviços em favor do próximo” (CIC, 2379). O Papa João Paulo II, discursando no Encontro Jubilar das Famílias Adotivas, no ano 2000, enfatizou que “ adotar crianças, sentindo-as e tratando-as como verdadeiros filhos, significa reconhecer que as relações entre pais e filhos não se medem somente pelos parâmetros genéticos”, pois “o amor que gera é, antes de mais, um dom de si, pois há uma ‘geração’ que vem através do acolhimento, da atenção, da dedicação”.
Pedimos a Deus que as famílias se sintam convidadas e tocadas por Sua perfeita caridade a assumirem com alegria e esperança esse tão grande propósito. Clamamos a Maria Santíssima, cujo ventre trouxe ao mundo o Salvador de todo o gênero humano, e cujo Imaculado Coração nos adotou a todos aos pés da Cruz de Jesus, para que Ela derrame coragem e fé nos corações dos homens e das mulheres que ainda não se sentem preparados para essa missão. E que possamos todos nos inspirarmos nas Sagradas Escrituras, rezando com São Paulo, pedindo que o Espírito de Deus, que nos deu a vida, controle também a nossa vida (cf. Gl 5, 25), confiantes de que o Defensor, o Paráclito, jamais nos abandona e a todo momento nos inspira nas dificuldades e nas batalhas, destes e de todos os tempos.
Anamaria de Souza Cardoso
Doutora em Ciências Biológicas
Arquidiocese em Missão